Mais que atos isolados de vandalismo ou ações extemporâneas de indivíduos autônomos, através de rigoroso trabalho de pesquisa e documentação de postagens e declarações publicadas nas redes sociais e em veículos de comunicação, a reconstituição da linha do tempo golpista publicada pelo Instituto Democracia em Xeque (DX) em 08 de janeiro de 2024 evidencia o que a sociedade brasileira pode tomar ciência ao longo dos dois últimos anos – a partir da evolução das investigações, indiciamentos e condenações conduzidas pela Polícia Federal, Ministério Público e Poder Judicial – ou seja: estivemos diante de uma trama urdida ao longo desse período para promover um golpe de Estado e colocar abaixo o Estado Democrático de Direito no país.
Como mostra a linha do tempo, as três estratégias que orientaram as narrativas golpistas nas redes sociais nos últimos anos também resultaram nas ações daqueles que de forma, até agora, oculta, planejaram, financiaram e lideraram as ações golpistas que levaram a essa invasão na praça dos Três Poderes.
Estas estratégias, cabe destacar, são os três eixos centrais de acompanhamento e análise do debate nas redes sociais que balizaram a ação do DX desde seu início, em fevereiro de 2021, a partir da hipótese de risco de reprodução no Brasil de eventos similares aos ocorridos em 6 de Janeiro daquele ano nos EUA, quando da invasão do Capitólio, quais sejam:
1) Minar a confiança no sistema eleitoral: campanhas de desinformação com uso de conteúdos enganosos e notícias fraudulentas (fake news), dentre outros fatos sabidamente inverídicos e gravemente descontextualizados, foram veiculadas de forma coordenada e sistemática nas redes sociais para levantar a suspeição quanto à higidez do sistema de votação, com o questionamento à urna eletrônica, ao código fonte e ao processo de apuração e consolidação dos votos;
2) Descredenciar o árbitro da partida: questionamentos à imparcialidade do “árbitro” do processo, com ataques à Justiça Eleitoral em seu conjunto, bem como aos ministros das Cortes Superiores, principalmente o então presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, e demais ministros das Cortes Superiores de Justiça, principais alvos dos discursos odiosos e violentos proferidos pelos dirigentes golpistas do bolsonarismo.
3) Estimular os ataques aos Três Poderes: o estímulo permanente à convulsão social e ao levante popular violento contra as instituições democráticas que culminaram na invasão e depredação das sedes dos Três Poderes, emulando táticas vistas no Capitólio dos Estados Unidos, com o objetivo de levar o país ao caos, ensejar a decretação de medidas de exceção (GLO, Estado de Sítio) e a conseguinte assunção do poder por parte de setores das Forças Armadas, aderindo à tentativa golpista.
O DX segue atento aos processos de investigação e indiciamento de todos os eventuais envolvidos, desejando que, sempre que respeitados o devido processo legal, o direito à ampla defesa e a presunção de inocência, sejam igualmente rigorosos e céleres os respectivos processos de responsabilização.
O DX continuará à disposição da sociedade civil, das instituições democráticas e da Justiça, legitimadas pela nossa Constituição Federal, apoiando e ajudando a fortalecer o Estado Democrático de Direito a partir de iniciativas de promoção da integridade da informação e de enfrentamento aos discursos antidemocráticos, de ódio e de promoção do extremismo político violento.
Por fim, reforçamos as propostas anteriormente apresentada pelo DX:
1) A necessária regulação dos meios digitais: O impulso coordenado nas redes sociais que levou à radicalização golpista e aos atos criminosos de 8 de Janeiro deflagrou a importância das plataformas na moderação de conteúdo para combater informações enganosas e discursos perigosos. No entanto, a moderação ainda é deficiente, permitindo a persistência de publicações prejudiciais à manutenção da ordem democrática. Para enfrentar esse problema, é crucial ampliar as discussões no Congresso sobre projetos que delineiam os direitos e responsabilidades das plataformas de mídias sociais, visando estabelecer regras para garantir a liberdade de expressão, acesso à informação, combate à desinformação, proteção de dados, transparência e limites ao controle de mercado por essas plataformas. Se é bem verdade que as plataformas digitais não devem atuar como “árbitros da verdade”, tampouco como cúmplices da mentira.
2) Educação Cidadã e Midiática: Negligência na cultura cívica e cidadã na educação favorece a disseminação de notícias falsas e discursos de ódio. Para este enfrentamento, é essencial que o Estado promova uma educação abrangente em cidadania e mídia. Propõe-se a criação de uma política pública participativa para a educação cidadã e a implementação de programas de literacia informacional e midiática em todos os níveis educacionais, apoiados pelo governo e plataformas digitais. Essas ações visam capacitar cidadãs e cidadãos à participação ativa na democracia e a discernir informações confiáveis, promovendo competências digitais, raciocínio lógico e reflexão crítica.
3) A instituição do 8 de janeiro em feriado nacional de Memória Democrática, sugerindo alteração na proposta de emenda à Constituição 111/2021, modificando, a partir de 2027, a data para a posse dos chefes do Executivo eleitos pela urna eletrônica,substituindo a data de 5 para 8 de janeiro.
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