Letícia Casado • Colunista do UOL | Reportagem | 11/05/2024
Cientistas políticos que analisam as redes sociais dizem que o movimento de bolsonaristas contra as Forças Armadas está crescendo de maneira constante há algum tempo, mas ficou mais cristalizado e disseminado com a participação de parlamentares agora na crise do Sul.
Deputados bolsonaristas como Ricardo Salles, Carla Zambelli, Mario Frias e Luiz Philippe de Orleans, todos do PL em São Paulo, têm feito críticas, abertas ou veladas, ao trabalho dos militares no estado. A proliferação de notícias falsas na internet já foi alvo de reclamação dos ministros do governo e provocou a abertura de uma investigação por parte da Polícia Federal.
“Quando uma figura, que já foi ministro e é deputado federal, aparece fazendo sarcasmo com os militares, realmente chama atenção, é um passo além”, diz o cientista político Claudio Couto, da FGV (Fundação Getulio Vargas), referindo-se a Salles. O parlamentar publicou um vídeo nesta sexta-feira (10) criticando o que classificou ironicamente de “eficiência logística”.
Alguns motivos indicam a decepção de bolsonaristas com os militares: a falta de apoio à tentativa de golpe no fim de 2022; as críticas feitas por generais que se colocaram contra o plano de impedir a posse de Lula; a delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid; as declarações de militares na CPI do 8 de janeiro; a falta de intervenção no TSE (Tribunal Superior Eleitoral); e a atuação pacífica das Forças Armadas no atual governo.
Apoiadores e integrantes do governo Jair Bolsonaro tinham a ideia de que se manteriam no poder com o apoio das Forças Armadas. As faixas pedindo intervenção militar viraram uma marca das manifestações a favor do ex-presidente —incluindo nos atos de 7 de setembro.
“Não à toa os apoiadores foram acampar na frente do quartel. Não se dirigiam a qualquer um, mas especificamente aos militares. Usavam ‘selva’ (uma gíria de soldados e majores) como lema, além de toda a estética de inspiração militar, batendo continência e marchando”, diz Couto.
“[Apoiadores de Bolsonaro] estão se vendo abandonados por aqueles em que depositaram toda confiança [Forças Armadas].”
– cientista político Claudio Couto
Ana Julia Bernardi, diretora de projetos do instituto Democracia em Xeque, diz que as Forças Armadas passaram a ser vistas pelos bolsonaristas como parte do estado brasileiro, que é comandando por Lula; portanto, “não servem mais” e “também precisam ser criticadas”.
“Até para mostrar para o eleitorado: ‘eles (militares) não nos apoiaram lá atrás, não foram coniventes com a nossa tentativa de se manter no poder e são coniventes com este governo que não ajuda a população’.”
Ana Júlia Bernardi, diretora de projetos do instituto Democracia em Xeque
Especialistas consultados pelo UOL também veem por trás dos comentários uma máquina de fake news organizada e bem articulada na distribuição de desinformação.
Nesta sexta, o ministro José Múcio (Defesa) disse que a disseminação de notícias falsas está atrapalhando o trabalho dos militares no Sul.
“Alguns desavisados têm nos atrapalhado. Estamos sendo vítimas, principalmente as Forças Armadas, de fake news, de pessoas que, enquanto estamos lutando para salvar vidas, essas pessoas estão pensando em eleições, em votos, em agredir”, disse Múcio.
O ministro Paulo Pimenta (Secretaria de Comunicação Social) disse à Globonews que uma informação falsa sobre um problema de resgate envolvendo o Exército fez com que uma equipe fosse deslocada para um hospital —deixando de atuar na área em que estava— para chegar lá e descobrir que era mentira. Além de não conseguir trabalhar, os militares ainda foram hostilizados no local.
Desde o início da crise no Rio Grande do Sul, o UOL Confere tem feito reportagens para desmentir as principais fakes news que estão circulando sobre o tema.
ESTE RELATÓRIO ESTÁ LICENCIADO SOB A LICENÇA CREATIVE COMMONS CC BY-SA 4.0 BR.
Essa licença permite que outros remixem, adaptem e criem obras derivadas sobre a obra original, inclusive para fins comerciais, contanto que atribuam crédito aos autores corretamente, e que utilizem a mesma licença.
https://creativecommons.org/